A relação dos povos indígenas com o Brasil em 50 anos de cartas públicas

Por Rafael Xucuru-Kariri. Comecei a escrever cartas ainda criança, na aldeia de Coroa Vermelha, do povo Pataxó. No café da manhã ou no almoço, na ida ou no retorno da escola, minha casa nunca estava vazia. Líderes Tupinambá, Pataxó Hã-Hã-Hãe e Pataxó discutiam os rumos dos seus movimentos políticos com meus pais, funcionários da Fundação Nacional dos Povos Indígenas, a FUNAI. Como faço parte da primeira geração de indígenas alfabetizados em grande número nas escolas públicas, entre as décadas de 1990 e 2000, era convocado, por minha mãe, a ouvir e passar para a máquina de escrever o resultado das discussões e parte do pensamento indígena sobre a relação que temos com o Estado brasileiro. 

Heterodoxia Rebelde e Memória: 50 anos do Programa de Pós-graduação em Ciência Política do IFCH-UNICAMP

Por Carlos Eduardo Landim e Andréia Fressati Cardoso. Qual é o papel desempenhado pela Ciência Política em nosso tempo? De que forma o Programa de Pós-Graduação do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas (IFCH) foi moldado e, simultaneamente, moldou as diferentes conjunturas históricas e políticas do país? Em que medida sua proposta inovadora, marcada pela insígnia de uma “heterodoxia rebelde”, contribuiu para redefinir os paradigmas da Ciência Política brasileira? Essas e outras questões foram abordadas pelos participantes do seminário que marcou os 50 anos do Programa de Pós-graduação em Ciência Política (PPGCP) do IFCH, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), realizado nos dias 12, 13 e 14 de novembro de 2024. 

Comentário sobre o livro “Brasil em disputa: uma nova história da economia brasileira”, de Pedro Rossi (Planeta do Brasil, 2024)

Por Monica Stival. A ideia de que o Brasil está em disputa é o eixo condutor da nova história da economia brasileira nos últimos vinte anos proposta por Pedro Rossi. A obra não é nova porque traz elementos obscurecidos nas análises que foram produzidas ao longo dos anos, nem porque surpreende com uma tese inesperada. É nova porque organiza o que está em disputa – e essa é a atitude política mais importante que podemos ter ao nos colocarmos no amplo debate social atualmente. Afinal, vivemos tempos em que a noção de disputa está cada vez mais fora do jogo.

Imperador, Forças Armadas, Supremo Tribunal Federal: a função moderadora no Brasil

Por Vitor Hugo Sampaio. Este artigo é uma versão resumida e sintetizada de um capítulo do livro “Sociologia & história do constitucionalismo brasileiro”.Este trabalho tem por objetivo traçar um breve panorama histórico acerca do Poder Moderador no Brasil, do Império à Nova República. Buscamos descrever suas funções, desenvolvimento histórico e as instituições que desempenharam tal função no país em seus diferentes períodos históricos até às recentes celeumas envolvendo o tema durante o governo Jair Bolsonaro (2019 – 2022).

A RELAÇÃO ENTRE O TERRORISMO DOMÉSTICO E A EXTREMA DIREITA NOS ESTADOS UNIDOS: O CASO DA INVASÃO AO CAPITÓLIO (2021)

Por Yasmim Abril M. Reis. Neste texto argumento que o fenômeno do terrorismo não é uma forma exclusiva de expressão política que se restringe à atualidade dos Estados Unidos. As importantes transformações da década de 1990, com o fim da bipolaridade, a dissolução da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) e a ascensão dos Estados Unidos como potência unipolar, marcaram a virada do século. Assim como o evento dos atentados do 11 de setembro de 2001, quando os Estados Unidos direcionaram sua política externa ao combate ao terrorismo internacional.

Cem anos de A ideia de razão de Estado na história moderna

Por Bernardo Ferreira. Publicado em 1924, Die Idee der Staatsräson in der neueren Geschichte (A ideia de razão de Estado na história moderna), do historiador alemão Friedrich Meinecke, é um livro profundamente marcado pelo impacto da Primeira Guerra Mundial. No projeto inicial, em princípio intitulado Staatskunst und Geschichtsauffassung, Meinecke imaginava abordar as conexões entre as novas artes de governar surgidas a partir do Renascimento e a moderna concepção da história característica do historicismo. Para o historiador, a associação entre as artes do governo e o historicismo moderno decorreria de uma espécie de afinidade eletiva: em ambos os casos o pensamento seria levado a concentrar-se na individualidade da experiência e das situações, seja na reflexão sobre a particularidade dos interesses de cada Estado, seja na atenção dirigida à singularidade irredutível das vivências históricas.

Nozick e a crítica à noção de “justiça distributiva”

Por Caio Motta. Anarquia, Estado e Utopia (1974), de Robert Nozick, é amplamente reconhecido como um dos textos mais importantes da filosofia política do século XX. Sua relevância se mantém, não apenas pelo rigor filosófico, mas também porque suas conclusões morais e políticas desafiam as posições predominantes entre os filósofos políticos acadêmicos, especialmente aqueles inclinados a teorias distributivas de justiça. Paradoxalmente, o rigor intelectual que torna a obra de Nozick amplamente reconhecida também é o principal motivo pelo qual tantos se sentem compelidos a refutá-la.

50 anos de Anarquia, Estado e Utopia: Robert Nozick e a coragem de mudar de ideia 

Por Julia Sichieri Moura. Há 50 anos Robert Nozick publicava o livro Anarquia, Estado e Utopia (1974). Conforme nos mostra Thomas Nagel no prefácio da edição de 2013, o livro foi escrito em um período de transformação e ebulição teórica no âmbito da filosofia moral e política estadunidense e no contexto de uma geração de acadêmicos e acadêmicas influenciados pelos escritos de John Rawls sobre justiça social e além do contexto político da época (NAGEL, 2013).

Retrocesso democráticos no governo Bolsonaro (2019-2022): Tensões e disrupturas entre burocracia e ala política dentro do Ministério do Meio Ambiente

Por Nicolas Bortolatto Garcia Costa. O incentivo à democratização em diversos países é um fenômeno relativamente recente na história política. Conforme relata Huntington (1991), entre 1974 e 1990, houve um crescimento no número de regimes democráticos ao redor do globo. Entretanto, esse processo, longe de ser linear[2], é resultado de diversas tensões dentro de cada democracia. Assim, apesar de alguns países se democratizarem, líderes autocratas (eleitos via voto popular) também começaram a surgir  nesses regimes. Esse fator provoca uma corrosão no modelo democrático vigente, permitindo que o autocrata se aproprie do poder. O modo escolhido contemporaneamente para isso não envolve mais golpes repentinos, como no passado, mas sim, ao assumir o poder, o autocrata promove uma erosão das bases institucionais e realiza a ampliação gradual de seus poderes.

Gaza, um desafio moral

Por Reginaldo Nasser. Desde 07 de outubro de 2023, a partir dos massacres liderados pelo Hamas que causaram a morte de mais de mil israelenses, entre militares e civis, a ação militar israelense, na sequência, colocou-nos diante de um processo histórico sem precedentes. Do alto de sua longa experiência na luta contra o racismo nos EUA, a ativista Angela Davis não poderia definir melhor o momento em que passamos a viver: “A Palestina é um teste moral para o mundo”.