Ronaldo Tadeu de Souza[1]
Perry Anderson, em seu ensaio O Pluralismo de Berlin, formulou os seguintes comentários ao autor de A Originalidade de Maquiavel, Dois Conceitos de Liberdade e As Origens do Romantismo: no primeiro parágrafo do texto afirma que ele, Berlin, foi
herói intelectual de Noel Annan, cuja heroína política é Margaret Thatcher, deveria Isaiah Berlin ser abandonado aos entusiasmos – ‘fora de moda’ – do Our Age? Ou submetido aos respeitosos aplausos para o seu último volume, que vão do Spectator até o New Statesman? Ele próprio [Berlin] é mais modesto. ‘Falo de outras pessoas. Examino suas opiniões. Mas, e eu?’ disse ele recentemente, negando grandes noções de sua própria lavra. A Richard Ingraus ele disse que suas opiniões são bem conhecidas. “Minhas ideias são muito inglesas. Apostei todas as minhas fichas na Inglaterra. É o melhor país do mundo”. Esse tipo de autodepreciação leal é muito suspeita. Uma visão de Berlin deveria começar de outro ponto (2002, p. 296).
E na última frase do artigo, Anderson diz, “a figura ereta no Albany pode parecer tanto o ornamento do establishment britânico [e mundial] quanto o seu panegirista e o do Primeiro Ministro. Isto é um erro. É [em] outro […] ambiente, onde suas respostas são menos conclusivas, que o trabalho de Berlin merece o maior respeito crítico” (Ibidem, p. 316).
Entretanto, não se trata do pluralismo e da liberdade negativa que as admoestações de Berlin nos enunciam algo; sugere-se que suas lealdades políticas sejam tratadas em outro plano argumentativo, e não precisamos, assim como Perry Anderson, concordar com elas[2]. O “outro ponto” e o “outro ambiente” a que o historiador marxista e editor lendário da New Left Review alude é o das humanidades – as ciências humanas. É nelas que Isaiah Berlin tem, senão muito a nos dizer, ao menos como lançar certas advertências críticas. Nos dias de hoje há um ensaio de Berlin, foi esse o estilo de escrita que o consagrou como um dos grandes intelectuais do século XX, que incita à reflexão sobres os debates atuais – debates esses aos quais preponderam articulações reveladoras concernentes à disposição contemporânea das ciências sociais, do jornalismo de opinião, das análises de conjuntura e da compreensão da política (sobretudo, nesse último caso das perspectivas de esquerda e progressista).
Reunido em Estudos sobre a Humanidade, conjunto de textos que Berlin exibe uma densa erudição – tratando de Maquiavel e a história da ciência, teoria política e Herder, romantismo e Herzen – o ensaio O Divórcio entre as Ciências e a Humanidades é a lembrança de que em assuntos envolvendo seres humanos, como as artes, a literatura, a história, a nação a cultura, a moral, a religião, a linguagem e a política, são eles, e hoje elas, o núcleo existencial mesmo ao qual se deve concentrar nossas atenções. Berlin estava a admoestar sobre o destino das ciências naturais em face às ciências humanas no decurso da sociedade moderna. Se em um primeiro momento havia “a crença de que era possível fazer um progresso constante em toda a esfera do conhecimento humano” (Berlin, 2004, p.349), e por conhecimento humano entende-se a articulação entre a própria ciências naturais e a ciências do homem (e da mulher), nos termos de Berlin simplesmente humanidades, após o século XVIII houve a separação, circunstancial no início, porém drástica e intensa no fim do século XIX e por todo o XX.
Ora, não estava em jogo unicamente a cisão entre o que passava a ser dois campos distintos do conhecimento – impunha-se, a partir de então, uma assimetria com desconsiderações significativas para as humanidades e no mesmo movimento atribuía-se uma reputação desmedida às ciências naturais – que cada vez mais se afastava da ideia de progresso da vida humana, em direção à matematização das coisas dos homens. Assim, a extirpação do desejo de narrar as realizações entrelaçadas da ciência natural e das humanidades, em poucas palavras da razão e do bom senso, no coração dos indivíduos, preocupava Berlin. A principal ciência humana atingida por esse novo espírito, obviamente, foi a história. Com o passar do tempo, “o caráter positivista do novo movimento [das ciências naturais]” (Ibidem, p. 354) transformaria a linguagem e a ação prática no contexto imediato entrecruzado ininterruptamente – em fatos, mera e formalmente, estatísticos e descritivos. Mas as humanidades, e o estudo da história em particular, passariam, desde 1668, a ter a seu lado um aliado exuberante. É nele que Berlin irá se apoiar.
Giambattista Vico e as Ciências (Históricas) Humanas
Não há dúvida para os leitores e leitoras que frequentam e os estudiosos da obra de Isaiah Berlin a cultura viquiana dos seus escritos; ele, talvez, tenha sido o único grande teórico ao longo do século XX a reivindicar, verdadeiramente, o legado de Vico. A ciência humana da história que Berlin teve de opor aos destinos das ciências naturais, e o modo pelo qual ela assenhoreou-se das ciências sociais, era a reinterpretação dos sentidos da obra de Vico para os que se dedicavam a compreender os homens e as mulheres em ação (imanente) na história.
Giambattista Vico, que nasceu em Nápoles e ali permaneceu até sua morte em 1744, opôs-se vigorosamente, se tomarmos a estatura teórica e intelectual do A Ciência Nova, à transformação do conhecimento das coisas humanas em conhecimento matemático e geométrico. Seu adversário era o autor de Regras para a Direção do Espírito, Discurso sobre o Método e Geometria, René Descartes. O gênio de Vico não conformou sua alma erudita e refinada às imposições (não-autênticas) convencionais que cercavam o começo no século XVIII. Pois, a “matemática não era [para ele] um sistema de leis a reger a realidade, mas um sistema de regras em cujos termos era conveniente generalizar, analisar, predizer o comportamento das coisas no espaço” (Berlin, 2004, p. 364).
Mas nada disso significa o entendimento do homem na sua temporalidade existencial, na sua conformação contingente – narrada a-si e aos-outros-de-si pela linguagem. Assim, na obra de Vico “[ele] fez uso de uma antiga proposição escolástica pelo menos tão velha quanto a Santo Agostinho: a de que alguém só poderia conhecer plenamente o que tivesse pessoalmente criado” (Ibidem). (Não é fortuito que Karl Marx tenha sido leitor e admirador de Vico – a noção de que os homens e mulheres fazem a história, e podem e têm a ciência subjetiva da história[3], foi o legado de A Ciência Nova para o autor de O Capital e o para o marxismo.)
Ora, Berlin, ao comentar que em Vico nós compreendemos a “obra de arte, as “construções poéticas”, as “criações intelectuais” e as “constituições políticas” (cf. Berlin, 2004, p. 364) porque são decorrências de nossa ação na história, estava a alertar sobre a intensificação de processos assimétricos na disposição do conhecimento: pois, desde o século XIX, o elemento do dado natural impunha-se ao concebido imaginativamente pelos homens. E na medida em que isso ocorria, mais os lineamentos da psique, os gestos específicos das culturas, as modalidades de expressão e a interatividade criativo-reflexiva abrangente de um-com-o-outro ficavam soterrados pelas ciências naturais generalistas e suas técnicas, eminentemente, objetificadas de aferição.
Mas, na obra de Vico, insiste Berlin, encontramos uma hermenêutica histórica sobre as formas de variação expressiva de indivíduos, grupos, classes e nações. Para soerguer seu monumento à humanidade, à ciências humanas, então, foi necessário a ele e a Berlin, tendo no horizonte tais considerações compreensivas, se lançarem no entendimento da linguagem enquanto modos significativos de enunciação. Contudo, a linguagem viquiana tinha um aspecto peculiar. Ela se desdobra, no âmbito de A Ciência Nova, em metafórica, poética e mitológica (cf. Berlin, 2004, pp. 366 e 367).
Excurso sobre a “Tábua das Coisas Civis” (Frontispício sobre a Obra “Ciência Nova”)
Ali, Vico diz – “porque os filósofos até agora, tendo contemplado a divina providência apenas do ângulo da ordem natural, demonstraram tão somente uma parte, pela qual a Deus […] aprestam-se, por parte dos homens, as adorações com sacrifícios e outras divinas honras; mas não o contemplaram pela parte que era mais própria dos homens, cuja […] [a existência] possui esta principal propriedade: de serem sociáveis (1999, p. 29). Com efeito, se Hércules foi alçado às estrelas, isto representava o princípio dos tempos; não o iniciou esse quando ele matou o Leão, que cuspia fogo, com as próprias mãos, mas no impulso de perceber a dimensão subjetiva dos tempos mesmo no percurso insano até as estrelas. O fundamento de todas as nossas circunstâncias como humanos – sempre um-com-o-outro – é a disposição da temporalidade, com suas múltiplas significações e variabilidades de entendimento, em nós e feito por nós. Daí Homero, que não teve de matar um leão e nem foi lançado ao céu –, ter narrado os Deuses no alto do Olimpo onde estavam em conversações e disputas celestes; a posição homérica, na Ciência Nova, é de figurar “o tempo fabuloso das nações” (Ibidem, p. 32), pelo que se transfigura na linguagem dos mitos celestiais, então, a era histórica das nações. Em Hércules e Homero a “Tábua das Coisas Civis” exprime, assim, o entrelaçamento dos sentidos filológicos, o ser-em-si na coletividade histórica por ele mesmo forjada no decurso complexo da vivência, “as coisas humanas” (Ibidem, p. 35).
Essas considerações digressivas querem dizer que as formas matemáticas e generalistas das ciências sociais naturais, sem perder seu valor no que concerne ao conhecimento descritivo par excellence, estão em profundo alheamento do entendimento da ação dos homens e mulheres socio-historicamente dados. Assim, Berlin comenta a constelação de arranjos significativos que estão presentes na linguagem das metáforas: “discurso metafórico é o modo […] [comum] de expressão de homens [originários]” (2004, p. 367).
Pois, na alegorização das modalidades de linguagem exteriorizada está o artifício esplendoroso da imaginação histórica dos homens. De modo que dizer; “o sangue está fervendo” (Ibidem) não é uma depreciação da fala – é, isto sim, o momento retórico pelo qual certos povos e culturas diziam a raiva. É a narração mesma acerca das formas de (auto)entendimento impelido pela história. Na concepção de Berlin de ciências humanas era imprescindível traçar as trajetórias de expressão de maneiras de ser imemoriais, pois com esse conhecimento teríamos a percepção de que as ciências naturais matematizadas estavam muito afastadas de proceder à compreensão da humanidade.
Vico: informou a seus leitores, e a Isaiah Berlin em particular, da presença da “linguagem poética” (Berlin, 2004, p. 367), da nossa disposição para entoar, simbolicamente, a vida na cotidianidade por versos. Nossa humanidade está muito além de modelos testáveis com vistas a generalizações formais; os homens desde seus primeiros passos nos ciclos histórico-culturais de organização social cantam e melodiam – de sorte a significar a-si nas épocas sucessivas. Nós somos, para Berlin, poemas antes de gramáticas geometrizadas. Essa construção viquiana desdobra-se em uma hermenêutica das formas de falar pelo incomensurável – trata-se da linguagem mitológica.
Aqui os signos da experiência exteriorizam seus sentidos no idioma do humanamente inacreditável; como um “trovejador barbudo” (Ibidem, p. 367) representa a onipresença e a onisciência abrangente das infinitas modalidades de se ser na história e na sociedade? E ele o assim apresenta – pois eram os “homens [que] falavam” o pai-criador de todos os deuses. Ora, na formulação de Berlin dessa novíssima ciência de Giambattista Vico, que conforma pelo argumento negativo os limites e até por vezes os equívocos das posições encaminhadas pelas ciências (sociais) naturais, a objetificação do humano enquanto tal, “devemos nos perguntar como o mundo deve ter sido para aqueles que encontravam sentido num emprego assim da linguagem, que para nós quase não faz sentido” (Ibidem, p. 367).
Com efeito; há tantas Cibeles, Hidras e Ceres, quanto há a experiências de diferentes percepções da sociedade na história. (Daí que na Ciência Nova – Vico postula, diante da filosofia geométrica cartesiana, a filologia, o entendimento das coisas humanas pelos significados que os homens e mulheres atribuem à sua história e à sua cultura pela linguagem, mesmo a extraordinária.)
Assim, o progresso das ciências evoluía linearmente, dado o desenvolvimento de instrumentos técnicos e da própria técnica como tal. Eles com isso passaram a invadir as ciências sociais – com a conivência delas , é certo – o que no século XX (e no início do XXI) se tornará predominante. Mas Vico, dirá Berlin, construirá nas páginas labirínticas de sua obra, “um materialismo histórico engenhoso e imaginativo” (Ibidem, p. 370). O que isso quer dizer para o autor de Ainda Existe a Teoria Política?
O que se estava a enunciar era uma crítica à concepção que atribuía um “caráter inalterável da natureza humana” (Berlin, 2004, p. 369), e a mensagem berliniana é um eco desta advertência, ao menos precisamente nesse texto, e bem entendidas as coisas no horizonte (as lealdades…) do nosso autor. Essa noção organizou parte importante das reflexões dos pensadores; e não só do medievo, mas, e sobretudo, no mundo moderno – o mundo das descobertas científicas. Conquanto o desvelamento da condição humana autônoma tinha sido difundido desde os primeiros vestígios de mudança de horizonte existenciais trazidos com o Renascimento, havia a necessidade intrínseca à ciência de compreender as regularidades, a permanência, dos fenômenos investigados.
O trânsito impositivo das modalidades de conhecimento da natureza para as humanidades é o que preocupou Giambattista Vico. Pois regularidades, permanências, universalismos, tinham de pressupor, de certa maneira inevitavelmente, a abstração, uma abstração vazia para dizer com Marx – “fraseologia abstrata” (Berlin, 2004, p. 370) –, das realidades constitutivas da “autocriação” e “autotransformação” (Ibidem) na história de homens e mulheres. E as palavras e a linguagem são as formas em que, diz Berlin, aquelas exprimem o fazer humano no tempo. Ora, é que para Isaiah Berlin (via Vico) as ciências (sociais) humanas têm de perscrutar uma “história [que] deve ser o relato da sucessão e variedade da experiência e da atividade dos homens, de sua contínua autotransformação de uma cultura para outra” (Ibidem, p. 372).
Excurso sobre “Dos Elementos [Humanos]” (“A Ciência Nova”, “Livro I”)
A história não é a memória inerte das coisas passadas, a posição imóvel dos homens e mulheres no cosmo abstrato – e dispostos geometricamente. Tudo quanto se põe no mundo é a articulação entre a “humana sociedade” (Vico, 1999, p. 93) com as “paixões dos homens” (Ibidem) diante das “próprias coisas [materiais] presentes” (Ibidem, p. 91). Porquanto estarem na obscura situação de viverem – e conviverem – entre si, os indivíduos são impulsionados à verdade do tempo, de modo que, pelas necessidades circunstanciais, e não a da maligna mente universal racional, teve de forjar “diversas línguas articuladas, com a qual se concebe […] a história no tempo de todas a nações” (Ibidem, p. 95). Por isso, Vico interpreta do proceder antes e/ou no mesmo meneio a “ordem das coisas” (Ibidem, p. 112), de acordo com o ser na temporalidade imanente, para significar os modos de vivência na linguagem – daí “lex, que antes deve ter [o sentido] [da] colheita de glande de carvalho” (Ibidem, p. 112 e 113), alegorizar os gestos de conformação da autossustentação da vida. Na história entrelaçada das situações objetivas, portanto, está o momento das ideias; “a ordem das ideias” (Ibidem, p. 112) são para os homens no seu sentir necessário. Assim, na nova ciência viquiana é possível constituir, e foi essa a obstinação de Vico, o conhecimento não pelos sistemas matemáticos, pelos vazios dos quantitativos, pelas imputações de falsas qualidades, mas pela filologia dos símbolos sociáveis, pelo que “da humana sociedade […] saíram os costumes [e dentre eles] […] a cristã religião” (Ibidem, p. 127). (A atividade no existir histórico de homens e mulheres: sua explicitação com palavras, poética e retórica, ciência filológica humana, a exuberância de A Ciência Nova..)
Com efeito, para Isaiah Berlin as ciências naturais do século XX, tristemente, amputaram de seu corpus cognitivo qualquer vestígio de cultura humana. A sistemática “acumulação de evidências empíricas sobre o comportamento humano […] [convertidos sem mais em] generalizações sociológicas [e] […] conceitos estáticos” (Berlin, 2004, p. 375), perde o esmero intrínseco da posição dinâmica dos homens no seu fazer histórico. Mas não só: perde-se, com isso, o conhecimento mesmo autêntico; um conhecimento que realiza, humanamente seus fins: a emancipação e a liberdade efetiva.
Convém, antes de enunciar certas sentenças acerca de grupos, culturas cotidianas, classes sociais, indivíduos e formas de vida com e a partir de modelos, forjados não teoricamente, mas matematizados, tabulados, estatistificados, com a ambição desmedida e arrogante, elitista e ingênua, e em nossas ciências sociais estamos cercados por isso nos últimos anos, pela busca, por vezes cínica, de entender o fenômeno Bolsonaro, bolsonarista e o bolsonarismo e seus eleitores, pois o que se quer é afastar-se do-si-mesmo que se elevou sobre as costas de nossa sociedade, a nossa manifestação da vida (como disse o viquiano Marx em a A Ideologia Alemã), ler o que Isaiah Berlin tem a nos dizer:
não há nenhuma estrutura imutável da experiência a ser refletida por uma linguagem perfeita que poderia ser inventada e para a qual aproximações imperfeitas dessa linguagem poderiam ser transpostas. A linguagem dos assim chamados primitivos não é uma versão imperfeita do que gerações posteriores vão expressar com mais acuidade – tal linguagem encarna sua visão única do mundo, que pode ser compreendida, mas não traduzida completamente na linguagem de outra cultura. Uma cultura não é uma versão menos perfeita de outra: o inverno não é uma primavera rudimentar; o verão não é o outono não desenvolvido (2004, p. 375).
E seres humanos não são condutas que se podem medir com instrumentos, questionários e padrões estatísticos – eles são a sua história no tempo, no costume, na luta (de classes), na linguagem e nos símbolos poéticos.
* Este texto não expressa, necessariamente, as posições do Boletim Lua Nova ou do CEDEC.
Referências bibliográficas
ANDERSON, Perry. O Pluralismo de Berlin. In: Anderson, Perry. Afinidades Seletivas. São Paulo Boitempo, 2002.
BERLIN, Isaiah. O Divórcio entre as Ciências e as Humanidades. In: BERLIN, Isaiah. Estudos sobre a Humanidade: uma antologia de ensaios. São Paulo. Companhia das letras, 2004.
MARX, Karl. Maquinária e Grande Indústria. In: _____. O Capital, V. I, Livro Primeiro, Tomo, 2. São Paulo. Nova Cultural, 1988.
VICO, Giambattista. A Ciência Nova. Rio de Janeiro. Record. 1999.
[1] Doutor e Pesquisador de Pós-Doutorado no Departamento de Ciência Política da USP, no Grupo de Pesquisa Soberania Popular em Perspectiva Histórica (CNPq-USP), pesquisador no Cedec-Centro de Estudo de Cultura Contemporânea (Núcleo de Teoria e Pensamento Político) e editor do Boletim Lua Nova/Cedec e coordenador acadêmico do Grupo de Pesquisa Política e Pensamento Crítico-USP.
[2] O próprio Anderson dirá com sutileza, em certo momento do seu texto, que Berlin, malgrado seus esforços eruditos para negar as imperfeições de superfície de um pluralismo monista, teve dificuldades na construção do seu argumento (cf. Anderson, 2002, p. 306-311): pois, para ele, “os objetivos humanos válidos são, na verdade diversos, mas não admitem uma composição coletiva. Mais de uma vez, Berlin enfatiza que os objetivos da vida são geralmente inconciliáveis, e até mesmo não-conciliáveis. Nenhuma organização da sociedade [está] em condições de satisfazer a todos eles. O defeito de seu pluralismo resulta dessa equação. O que é diferente é conflituoso, e o que é conflituoso não é relacional.” (grifo meu) (Anderson, 2002, p. 308). É que a tensão causada por Dois Conceitos de Liberdade no pensamento berliniano, não só enfraquece, mas por vezes, solapa a conformação teórica de um pluralismo abrangente e efetivo. Além disso, o pluralismo (e a liberdade) em Berlin foram algo eminentemente da “cultura do mundo ocidental” (Ibidem, p. 311).
[3] Assim, diz Marx: “Uma história crítica da tecnologia provara, sobretudo, quão pouco qualquer invenção do século XVIII cabe a um só indivíduo. Até hoje não existe tal obra. Darwin atraiu o interesse para a história da tecnologia da Natureza, isto é, para a formação dos órgãos de plantas e animais como instrumentos de produção para a vida das plantas e dos animais. Será que não merece igual atenção a história da formação dos órgãos produtivos do homem social, da base material de toda a organização social específica? E não seria mais fácil reconstituí-la já que, como diz Vico, a história dos homens [e mulheres] difere da história natural por termos feito uma e não a outra? A tecnologia revela a atitude ativa do homem para com a Natureza, o processo de produção direto de sua vida, e com isso também suas condições sociais de vida e as concepções espirituais decorrentes delas. Mesmo toda história da religião que abstrai essa base material é – acrítica. É efetivamente muito mais fácil mediante análise descobrir o cerne terreno das nebulosas representações religiosas do que, inversamente, desenvolver, a partir das condições reais de vida de cada momento, as suas formas celestializadas. Este último é o único método materialista e, portanto, científico. As falhas do materialismo científico natural abstrato, que exclui o processo histórico, já se percebem pelas concepções abstratas e ideológicas de seus porta-vozes, assim que se aventuram além dos limites de sua especialidade” (MARX, 1988, V. I, L. 1, Tomo 2, p. 6).
Fonte Imagética: Wikimedia Commons. Isaiah Berlin. Desenho de Arturo Espinosa. 18 dez. 2012. Disponível em: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Isaiah_Berlin_for_PIFAL.jpg>. Acesso em: 12 abr. 2023.