Da Incomunicação à Comunicação Decolonial: Mulheres Indígenas contra Invisibilidades e Estereótipos

Por Lorena Esteves e Danila Cal. As narrativas que circulam sobre indígenas, em geral, reforçam estereótipos, generalizam e silenciam as singularidades dessas sociedades (Neves; Corrêa; Tocantins, 2013). Também recaem sobre os/as indígenas o imaginário de “bons selvagens, ingênuos, incapazes de se cuidar”. Mais especificamente, em relação à mulher indígena, Ivânia Neves e Arcângela Sena (2020) evidenciam que os discursos que circulam reforçam o imaginário colonial da sensualidade, o estereótipo de que elas são desavergonhadas, despudoradas e que precisam de alguma forma ser contidas. Apesar da resistência dessas mulheres a uma identidade generalizante, os discursos, construídos historicamente, dão conta de um imaginário colonial que revela “uma mulher nua, selvagem, sensual, com atribuições que muitas vezes ultrapassam a condição humana” (Tocantins; Neves, 2016, p. 66).

Análise de conjuntura: superações desencadeadas a partir do encontro entre a práxis científica e a práxis política

Por João Henrique Araujo Virgens e Carmen Fontes Teixeira. Uma abordagem que costuma ser mais conhecida por pessoas com atuação política e/ou que frequentam encontros promovidos por movimentos sociais, sindicatos e partidos é a análise conjuntural. Se esse é o seu caso, é provável que você tenha participado de algumas ‘mesas de abertura’ abordando esse tema. É possível também que você já tenha se perguntado ou escutado a seguinte pergunta: “mas pra quê precisamos ter esse debate?”

As juventudes em ação no cenário multilateral: o Grupo de Engajamento Y20

Giulia Ribeiro Barão. A participação social nos fóruns multilaterais é uma tendência nas relações internacionais desde os anos 1990, período em que se intensificou o interesse da cidadania em ser escutada nos processos de tomada de decisão além do Estado. (Loureiro, 2023). Há um descontentamento com a falta de transparência e democratização desses espaços, que são distantes e inacessíveis à participação popular (Bringel; Muñoz, 2010), mas capazes de gerar compromissos e diretrizes que afetam diretamente a vida das pessoas nos territórios nacionais e locais.

60 anos de 1964 e o fomento a uma política de esquecimento

Por Caroline Silveira Bauer. Este texto apresenta uma breve reflexão sobre a negativa do governo Lula III em rememorar os 60 anos do golpe civil-militar de 1964, que implantou uma ditadura e um regime de terrorismo de Estado. Esta atitude, que surpreendeu a muitas pessoas depois da gestão presidencial anterior legitimar discursos negacionistas sobre o período, pode ser considerada um fomento a uma política de esquecimento. A reflexão se divide em duas partes: em um primeiro momento, farei algumas considerações sobre as potencialidades de atos de rememoração como o sexagésimo aniversário do golpe; depois, apresentarei a argumentação da existência de uma política de esquecimento, alimentada pela lógica da conciliação, examinando a decisão tomada pelo governo federal.

Cuidado, gênero e pobreza: os desafios das mulheres ao longo do ciclo de vida familiar

Por Lina Penati Ferreira e Silvana Mariano. Todo ser humano necessita de cuidado, embora o nível de dependência varie no decorrer da vida. Sabemos que bebês e crianças exigem atenção privilegiada, situação que tende a se repetir na velhice, embora as demandas sejam diferentes. Pessoas com deficiência também podem requisitar alguma atenção especial ao longo da vida. Mesmo em situações que fogem a esses exemplos, o cuidado com o outro é parte da produção do cotidiano: fazer comida, limpar a casa, contar uma história ou mesmo ceder tempo e atenção a alguém, todos esses são exemplos de cuidado. Entretanto, quando olhamos para a outra ponta da relação, não encontramos essa mesma universalidade. São as mulheres, em grande maioria, as responsáveis pelo trabalho de cuidado. Mais do que isso, quando falamos de Brasil, são mulheres negras e com idade entre 25 e 49 anos as principais responsáveis pelo trabalho doméstico e de cuidado (IBGE, 2020). Nesse sentido, o cuidado se torna um tema produtivo para o desvelamento sociológico de desigualdades de gênero, raça, classe e geração.

O lamento do general: da incriminação à reabilitação dos chamados presos políticos na ditadura brasileira

Por Lucas Pedretti. Em julho de 1970, no auge repressivo da ditadura militar brasileira, o general Antônio Carlos Murici deu uma entrevista para o Jornal do Brasil, com o objetivo de tornar públicos os resultados de um “estudo” que os militares haviam feito entre os militantes de oposição que estavam presos. As palavras de Murici, à época chefe do Estado-Maior do Exército, nos oferecem a rara oportunidade de observar como o regime operava na construção de estigmas e categorias acusatórias contra seus adversários.

A Aliança Global de Biocombustíveis e a presidência do Brasil no G-20

Por Jefferson dos Santos Estevo, Laís Forti Thomaz e Amanda Duarte Gondim. Em outubro de 2023, durante a 18ª Cúpula do G-20 na Índia, foi lançada a Aliança Global de Biocombustíveis (AGB)[4]. O país anfitrião, então detentor da presidência rotativa do G-20, que é composto por 19 países e 2 blocos regionais, teve a oportunidade de definir os principais temas da agenda de discussão, articulados em torno de dois pilares: o Pilar Financeiro, centrado em questões econômicas, e o Pilar Sherpa, abordando uma ampla gama de tópicos da agenda internacional, como mudanças climáticas, agricultura, saúde e transição energética. O lema da cúpula indiana, “Uma Terra, Uma Família, Um Futuro”, refletia o compromisso com a proteção ambiental e a promoção de ações globalmente transformadoras em prol de um futuro mais limpo, verde e sustentável (Estevo, Ribeiro, 2024).

A Tortura da Ditadura Militar Brasileira e o Ativismo da Anistia Internacional

Por Carla Vreche. A literatura sobre a formação das redes de ativismo transnacional de direitos humanos aborda, de forma ampla, como os casos das ditaduras militares e os horrores desse período em Argentina, Uruguai e Chile serviram de chama para que a sociedade civil nacional e internacional passasse a se articular em prol da defesa dos direitos humanos. Teorias conhecidas explicam como esses movimentos funcionam e se organizam. Pouco é debatido, porém, como a ditadura militar brasileira se insere nesse contexto. É a partir disso que este texto busca refletir sobre esse momento por meio da atividade da organização não governamental Anistia Internacional (AI)[2]. Como será discutido adiante, a questão da tortura foi, durante o regime militar, uma das que mais chamou a atenção de organizações internacionais de direitos humanos. Médici e Geisel, sobretudo, mostravam-se extremamente desconfortáveis com a opinião pública e com o trabalho desenvolvido por organizações estrangeiras que expunham o Brasil.

A questão da democracia em Trotsky e Adorno

Por Alina Ribeiro. O avanço da extrema direita em várias partes do mundo tem trazido de volta a palavra “fascismo” ao vocabulário coletivo. Desde a crise econômica de 2008, e desde a eleição do empresário Donald Trump como presidente nos Estados Unidos, tem-se observado novos aspectos econômicos e sociais que indicam uma crise da democracia liberal, algo inédito desde a queda do Muro de Berlim em 1989.

A Comissão Nacional da Verdade e seu legado no Brasil

Por Janaína de Almeida Teles e Bruno Boti Bernardi. À luz das discussões sobre os 60 anos do golpe de 1964, e diante tanto de novas tramas golpistas, como as do 8 de janeiro de 2023, quanto do bloqueio do presidente Lula a qualquer ato oficial para marcar as seis décadas completadas desde o início da ditadura militar, cabe relembrar – e remoer – a atuação da Comissão Nacional da Verdade (CNV). Tradicionalmente, comissões da verdade são pensadas como instrumentos decisivos de reconstrução da memória e da verdade. Quando bem-sucedidas, ao serem capazes de demonstrar as entranhas institucionais da repressão e as responsabilidades dos agentes do Estado dentro da estrutura autoritária, deveriam evitar novos retrocessos antidemocráticos. Porém, no caso do Brasil, a despeito das contribuições da CNV, logo após o seu encerramento houve um golpe contra a democracia no país em 2016, aprofundado em 2018, e que teve novas urdiduras ainda mais preocupantes após as eleições de 2022, quando, de fato, o Brasil esteve à beira de um novo precipício ditatorial.