Governamentalidade e consenso na construção da hegemonia neoliberal: aproximações teóricas
Por Kleiton Wagner Alves da Silva Nogueira e Ronaldo Laurentino de Sales Júnior. De que forma podemos pensar o neoliberalismo para além do senso comum que o vincula ao economicismo ou a uma ideia de diminuição do tamanho do Estado na promoção de políticas sociais? Numa aproximação inicial podemos de fato encontrar elementos da economia como centrais. Contudo, reduzir o neoliberalismo apenas a esta instância seria perder de vista a totalidade e a complexidade especificamente sociais do neoliberalismo: mesmo que num nível aparente promova austericídio e penalize a vida das classes trabalhadoras e grupos subalternos, como essa doutrina consegue manter a hegemonia diante dos seus efeitos sobre os grupos subalternos?
A questão da democracia em Trotsky e Adorno
Por Alina Ribeiro. O avanço da extrema direita em várias partes do mundo tem trazido de volta a palavra “fascismo” ao vocabulário coletivo. Desde a crise econômica de 2008, e desde a eleição do empresário Donald Trump como presidente nos Estados Unidos, tem-se observado novos aspectos econômicos e sociais que indicam uma crise da democracia liberal, algo inédito desde a queda do Muro de Berlim em 1989.
Sobre a observação e descrição dos costumes: de Jean-Jacques Rousseau a Harriet Martineau
Por Breno Dalla Zen. Neste texto, apresentarei uma reflexão sobre a evolução do pensamento crítico acerca da observação dos costumes, a partir de um recorte bibliográfico protagonizado pelo filósofo genebrino Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) e pela socióloga inglesa Harriet Martineau (1802-1876).
Raymond Aron recusou panaceia de livre mercado e buscou liberalismo político
Por Felipe Freller. Em 17 de outubro de 1983, morria o filósofo e sociólogo francês Raymond Aron (1905-1983), um dos principais pensadores liberais do século 20. Quarenta anos depois, sua obra permanece importante para a teoria política, a filosofia da história, a sociologia e a teoria das relações internacionais, mas seu nome parece, estranhamente, distante dos principais movimentos intelectuais e políticos que reivindicam o liberalismo. Algo a se lamentar e a se buscar compreender.
Cinquenta anos sem Hans Kelsen: homenagem e reflexão sobre o seu legado jurídico e político
Por Cristina Foroni Consani. Em 2023 completam-se 50 anos que Hans Kelsen faleceu, aos 92 anos, na cidade estadunidense de Berkeley. Como legado, deixou mais de 400 obras, muitas das quais foram traduzidas para mais de vinte idiomas. Certamente um dos mais importantes juristas do século XX, sua influência permanece não apenas na teoria do direito, mas também na filosofia do direito (com suas discussões a respeito da justiça e do direito natural, assim como do relativismo e do absolutismo no campo epistêmico, e da paz como valor no âmbito das relações internacionais), da sociologia (com foco nos temas da causalidade e da retribuição) e da teoria política (com análises a respeito da Constituição, do Estado, da democracia, da representação, da ideologia, do papel do poder legislativo e dos partidos políticos) – cf. Ladavac, 1998.
A teoria da liberdade de Mary Wollstonecraft
Por Gabriel de Matos Garcia. Mary Wollstonecraft pode ser caracterizada como uma republicana feminista. Republicana porque defende um conceito republicano de liberdade, o qual podemos denominar: “liberdade como independência”. Feminista porque defende a igualdade entre os sexos e porque possui uma interpretação da dominação masculina exercida sobre as mulheres. (HALLDENIUS, 2015). Obviamente, esses dois elementos interagem entre si e se influenciam mutuamente. O elemento republicano condiciona e estrutura todo o pensamento feminista de Wollstonecraft, ao passo que o elemento feminista faz com que Wollstonecraft desafie e qualifique o pensamento republicano de seu tempo, sem, entretanto, abandonar os seus princípios fundamentais. Meu objetivo neste breve texto é analisar um dos conceitos centrais dessa teoria feminista republicana de Wollstonecraft: o conceito de liberdade.
Experiência política autêntica – dinâmicas emocionais em junho 2013[1]
Por Cristiana Losekann. Na observação do contexto político desde 2013, no Brasil, fica evidente que as emoções como a raiva ganharam relevância impulsionando a ação política. Apesar disso, pouco se sabe sobre as dinâmicas que permeiam os processos afetivos da política e como eles estão conectados com outros aspectos da vida. É nesse sentido que proponho a observação das dinâmicas emocionais e afetivas para a melhor compreensão do processo político recente no Brasil. Dos protestos de 2013 às eleições de 2018, as dinâmicas políticas em diversas vertentes ideológicas, tanto à esquerda quanto à direta, envolveram jogos emocionais de alta intensidade e tensionamentos, produzindo momentos de entusiasmo e incentivos à ação. A chave para explicar o que se passou em junho de 2013 está, entre outros fatores, na compreensão do desejo por uma vivência política autêntica como elemento central de uma experiência política.
Em busca de um método: crítica social entre passado, presente e futuro
Por Gustavo F. Lima e Silva. Esse trecho de uma entrevista concedida por Michel Foucault nos anos 1970 é frequentemente invocado por aqueles que desejam se utilizar dos arquivos do pensamento político clássico, moderno e contemporâneo para o desenvolvimento de uma crítica social do tempo presente . Os textos do passado, segundo uma conhecida metáfora, poderiam ser mobilizados como uma “caixa de ferramentas”, de modo que conceitos, análises e métodos seriam presentemente mobilizados, ainda que apartados de seu contexto e até mesmo de seu sentido original. É interessante pontuar, entretanto, que tal figuração da entrevista de Foucault depende, ela mesma, de um exercício radical de descontextualização.
Democracia Equilibrista: imaginações políticas entre o autoritarismo e as regras democráticas[1]
Por Bruno Camilloto. Os autoritarismos estão na moda. De reivindicações por mais direitos a reivindicações por mais democracia, parece que as sociedades democráticas ao redor do mundo voltaram a experimentar processos de esgotamento daquelas forças sociais capazes de mobilizar potenciais emancipatórios e transformatórios em direção à realização das promessas por mais igualdade, mais liberdade, mais respeito, mais dignidade. As mais recentes crises econômicas ao redor do mundo colocaram em teste, uma vez mais, os fundamentos das sociedades democráticas e, com elas, as promessas não cumpridas da modernidade. Antes mesmo da crise sanitária/humanitária do Coronavírus em 2020, vimos surgir uma vasta bibliografia que anunciava precisamente o fim das democracias e de suas forças. Entre nós, os diagnósticos não desenharam um presente menos avassalador.
Contexto no singular e no plural: contextualismo e história social da teoria política
Por Sérgio M. Benedito. No campo da teoria política, de maneira geral, quando se faz referência ao contextualismo, logo entendemos que se trata da chamada Escola de Cambridge, representada com algumas variações e várias familiaridades por autores como Quentin Skinner, John Dunn e John Pocock. Não se trata é claro da única abordagem de ênfase histórica, mas daquela mais notória, por sua defesa de que autores e obras do passado devem ser situados em seu ambiente histórico para um melhor entendimento do que quiseram dizer ou sua intenção (Bevir, 2011).