Breves considerações sobre o centenário de “A ideia de razão de Estado na história moderna”, de Friedrich Meinecke

Por Sérgio Mendonça Benedito/ O conceito de razão de estado (RE) emergiu no discurso político italiano no decorrer do século XVI, primeiro na linguagem verbal e posteriormente em obras escritas. Foi apenas em 1589 que o jesuíta piemontês Giovanni Botero dedicou um inédito tratado à locução (sob o título de Della ragion di stato), argumentando a respeito do que ela implica em um governo tido como ótimo do ponto de vista prático e moral. A partir de então foram várias décadas de polêmica em torno do conceito, em que se disputava o seu sentido (objetando as definições alheias), questionava-se seu conteúdo (que práticas conformariam a “boa” ou a “má” RE), difamava-se Maquiavel por ter supostamente inventado uma razão de estado “tirânica” e “irreligiosa”, entre outros aspectos. Este debate se manteve ativo até aproximadamente o fim da quarta década do século XVII, quando esta literatura submergiu em detrimento das novas teorias do Estado e do contrato social, como de Thomas Hobbes. Por certo, a RE não deixou de ser mencionada ou discutida em uma ou outra obra; no entanto, não existia mais aquele ímpeto polêmico, ou tratados cujos títulos incluiam “razão de estado” de modo a salientar a sua centralidade.

Entrevista com Douglas Barros

Entrevistado: Douglas Rodrigues Barros – Filósofo, Ensaísta e Crítico Cultural. Doutor em Filosofia pela Universidade Federal de São Paulo-Unifesp. Autor dos livros, Lugar de Negro, Lugar de Branco?: Esboço para uma crítica à metafísica racial, editora Hedra; Guy Debord. Antimanual de Leitura, editora Sobinfluências Edições; e Hegel o Sentido do Político, editora Lavra Palavra. Está lançando este mês o importante e polêmico O Que É o Identitarismo? pela editora Boitempo. Douglas Rodrigues Barros é também psicanalista e intervém constantemente no debate intelectual e político com artigos para diversos meios de comunicação.

Trabalho de cuidado, violência e desigualdades: O G20 e o empoderamento econômico feminino como ferramenta de combate à violência baseada em gênero em pauta

Por Murilo Santos. Em 3 de julho de 2024, a Presidência da República enviou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei da Política Nacional de Cuidados (PL 2.762/2024), resultado de um Grupo de Trabalho que envolveu membros de 20 ministérios, sociedade civil organizada, academia e de governos estaduais e municipais (Câmara dos Deputados, 2024). Apesar da morosa tramitação do projeto no Poder Legislativo, a articulação de uma política pública de caráter nacional focada na diminuição do desproporcional “fardo do cuidado” que recai sobre as mulheres é inédita no país. A proposta também visa combater um dos principais pilares estruturantes da violência baseada em gênero, que é a desigualdade econômica.

Eleições 2024: a reeleição para além das emendas

Por Sergio Simoni e Nara Salles. Balanços sobre eleições municipais no Brasil são sempre temerários. São mais de 5500 disputas independentes, que visam eleger uma prefeita e de 9 a 55 vereadores. É verdade que nem toda unidade é igual. Os municípios variam em gênero, número e grau. Podemos dividi-los, por exemplo, entre capitais estaduais e o resto. Ou enfatizar o G103, o grupo de cidades que tem mais de 200.000 eleitores e que, portanto, exige maioria absoluta para eleição de prefeitos. Outros poderiam lembrar que é importante também considerar pólos regionais, municípios que têm influência em regiões específicas.

Nozick, Hayek e os fundamentos do libertarianismo

Por Gabriel de Matos Garcia. No ano de 2024, a publicação da obra Anarquia, estado e utopia (1974), de Robert Nozick, completa seu aniversário de 50 anos. Ao longo desse período, essa obra se consolidou como um clássico da teoria política contemporânea, sendo analisada, principalmente, como um importante contraponto a Uma teoria da justiça, publicada por John Rawls três anos antes. 

O tema da fome no G20: o lançamento da Aliança Global contra fome e a pobreza

Por Juscelino Eudâmidas Bezerra. No mês de novembro de 2024, durante a cúpula do G20 na cidade do Rio de Janeiro, o Brasil irá lançar oficialmente a Aliança Global contra a Fome e a Pobreza (AGFP). Os documentos que fundamentam a Aliança e estruturam seu modelo de governança foram aprovados na reunião de julho do G20. A iniciativa é uma das três prioridades do governo brasileiro no período de sua presidência do G20, junto da reforma de instituições de governança global e questões ligadas ao desenvolvimento sustentável, em especial, o debate sobre a transição energética.

Ciência com aspas II: político, ideológico, cultural[1]

Por José Szwako. Argumentei na primeira parte deste texto que retóricas, grupos e discursos negacionistas não devem ser rebaixados ao status de primatas pré-lógicos. Ao contrário, a fabricação negacionista de sentidos passa por laços morais e simbólicos que demandam escrutínio mais temperado. Sigamos agora com as últimas implicações da dimensão política, para em seguida ver como aspectos ideológicos e culturais atravessam irremediavelmente a forma pela qual as ciências se tornaram uma arma de peso na artilharia político-discursiva das direitas e das extrema-direitas, embora não somente delas.

Ciência com aspas I: político, ideológico, cultural[1]

Por José Szwako. As ciências entraram no debate político brasileiro sem data para sair. Do Congresso aos movimentos sociais, entre partidos e ativistas, da esquerda à direita, passando por ambos os extremos, chegando às mídias, plataformas e bares, envolvendo e dividindo famílias inteiras no WhatsApp, as ciências são hoje celebradas e hostilizadas, criticadas e relativizadas, hiperdimensionadas e rebaixadas em uma só sentença. Cada um e todos parecem acreditar que dispõem de informação e  conhecimento suficiente para decretar o que é, por exemplo, um Instituto Butantã e por que devemos, ou não, confiar nele assim como em outras instituições e personalidades científicas. No meio disso tudo, de uns tempos para cá, o tal do negacionismo emergiu com força igualmente impressionante no cotidiano, na sociedade civil, na imprensa, no trabalho, nas mídias, na internet, enfim, em nossa vida pública. Vemos grupos de políticos, de artistas, de profissionais liberais (e iliberais também); vemos corporações de médicos e advogados organizados; vemos ainda think tanks, sites e jornais montados por toda sorte de intelectuais e de acadêmicos – munidos com lattes e tudo –; todos bradando palavras de ordem contra autoridades científicas e alegando, de má ou boa-fé, estar em “defesa da ciência” e se dizer contra a “ideologia”.

Oficina de Formação Desjus: Segurança Alimentar, Cinturões Verdes e Resiliência Climática

Por Kenia Antonio Cardoso. Há um vínculo íntimo entre uma cultura alimentar, a cadeia produtiva do alimento e as mudanças climáticas. A compartimentalização do conhecimento gera, em muitos sentidos, uma visão limitada sobre a origem e as consequências dos problemas históricos e políticos vividos na contemporaneidade. Se as revoluções verdes difundiram práticas de esgotamento do solo e mudaram a organização do trabalho no campo, é na agricultura localizada que se encontra importante contribuição para um futuro mais justo. A oficina “Segurança Alimentar, Cinturões Verdes e Resiliência Climática” integra o terceiro ciclo de oficinas, fruto de uma parceria entre o Núcleo Democracia e Ação Coletiva e o Desjus, Núcleo de pesquisa em Desigualdade e Justiça, com o apoio da Fundação Tide Setubal.

A mudança do padrão na politização da burocracia federal brasileira, 1999-2021

Por Antônio Luiz Arquetti Faraco Junior. Desde Max Weber, a politização da burocracia, prática que envolve a nomeação ou designação de pessoas em órgãos governamentais pelo chefe do executivo, tem merecido a atenção de especialistas pelo impacto que pode provocar no desempenho das políticas públicas e na governança (Kennedy     , 2015; Lewis     , 2008). Sua utilização está relacionada à tensão entre controle político e competência técnica na Administração Pública, sendo geralmente aplicada para estabelecer formas de controle e supervisão da burocracia estatal e para o atendimento às demandas de patronagem, contribuindo para construção de apoio político às propostas e ações do governante.