James Baldwin e a evidência das coisas vistas

Por Danillo de Matos Santos Costa. O papel de um escritor que usa até a última gota da sua experiência nos seus escritos é analisado no ensaio The discovery of what it means to be an american, publicado no seu livro de 1961, Nobody knows my name. No texto, Baldwin revela que deixou os Estados Unidos porque duvidava que pudesse sobreviver à fúria do problema racial que vigorava então, e que pretendia evitar se tornar “[…] meramente um negro; ou, até mesmo, meramente um escritor negro” (BALDWIN, 1991, p. 17). O autor queria descobrir como sua experiência poderia ser usada para conectá-lo com os outros, em vez de isolá-lo. Em resumo, ele sentia a necessidade de “[…] encontrar os termos em que minha experiência poderia ser relacionada com a de outros, negros e brancos, escritores e não escritores” (ibid, p. 17).
A crítica marxista do direito hoje: novos modos de ler Pachukanis

Por César Mortari Barreira. Publicado há cem anos, A teoria geral do direito e o marxismo é um marco na história do pensamento jurídico. Desde sua primeira edição, em 1924, as reflexões de Pachukanis possibilitaram discussões que foram muito além das simplificações e esquematismos característicos do debate até então vigente. Não por acaso, autores como Radbruch e Kelsen reconheceram de imediato a importância do livro e procuraram rebater seus argumentos.
Linchamento e trauma em Going to meet the man, de James Baldwin

Por Thayza Matos. Falar sobre James Baldwin nem sempre é fácil e compreender as diferentes nuances de um artista tão complexo e prolífero é atividade para uma vida inteira. Em diversos romances, ensaios, peças de teatro, críticas literárias e sociais, Baldwin aborda de forma incisiva as diferentes camadas nas quais o racismo pode ser percebido e sentido por corpos negros.
O golpe militar de 1964: remoer o passado e resistir no presente!

Por Maria Amélia de Almeida Teles. A história do golpe de 1964, contada hoje devido a passagem dos seus sessenta anos, tem sido lembrada por alguns intelectuais da história, da sociologia, da política, que trazem reiteradamente, memórias de homens que resistiram à ditadura militar, uma das mais truculentas e sanguinárias da República brasileira, que durou por, pelo menos vinte e um anos (1964-1985).
Revisitando Pachukanis: um retorno ao problema da forma social

Por Thais Hoshika. Já foi dito que a “importância extraordinária de Karl Marx para a filosofia e a teoria social hoje deve-se em larga medida ao papel que a forma social desempenha em seu pensamento” (Murray, 1997, p. 38, trad. minha). Ainda que o legado de Marx à contemporaneidade não nos tenha oferecido uma teoria da forma social, ou daquilo que podemos denominar, com reservas, como sendo o seu “método”2 (questões que, a meu ver, são indissociáveis), tais definições podem ser extraídas das obras de maturidade de Marx – sobretudo O capital – onde esses conceitos estão presentes em um estado prático teórico.
A Igreja Católica e as Comunidades Eclesiais de Base durante a Ditadura Militar

Por Renata Meirelles. Como a Igreja Católica agiu em relação aos crimes da Ditadura no Brasil? Como se formaram as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) durante o período da ditadura militar? O que a formação das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) tem a ver com a atuação da Igreja Católica em relação à ditadura? Qual a relação das CEBs com os movimentos populares, a exemplo dos movimentos de bairro que floresceram na década de 1980?
Por um Pachukanis Insurgente: elementos de uma outra recepção da obra Teoria Geral do Direito e Marxismo

Por Moisés Alves Soares. Para além do expurgo que a obra de Evguiéni Pachukanis sofreu na União Soviética após a ascensão do stalinismo, por diversas razões, sua leitura centrada no direito compreendido como relações sociais constitutivas da dinâmica do mundo do capital encontrou forte resistência no campo acadêmico e quase nula influência no horizonte dos partidos políticos e movimentos sociais. No Brasil, o resgate de sua principal obra, Teoria Geral do Direito e Marxismo, apareceu, ainda que de forma contraditória, em tempos de resistência da crítica jurídica latino-americana durante o período da ditadura militar.
As cidades no G20 e a importância de uma perspectiva territorial para avanços nas agendas

Por Daniel A. de Azevedo e Pablo Ibañez. A Cúpula do G20 Financeiro no Brasil ocorre em meio a um momento extremamente delicado do sistema internacional. Além das duas guerras em curso, na Ucrânia e em Gaza, as tensões envolvendo médias e grandes potências têm aumentado, gerando uma ruptura daquilo que conhecemos como globalização. Hoje, teses sobre um processo de desglobalização já estão sendo cada vez mais discutidas, como o trabalho de Rajan (2023) bem evidenciou. Ainda que não haja um consenso entre os analistas, a “parceria sem limites” firmada entre China e Rússia, assim como as crescentes ações em bloco que países têm realizado, a exemplo do uso cada vez mais comum de sanções econômicas, elevam o grau de incerteza sobre como a geopolítica contemporânea lida com o complexo jogo de interesses globais. O que se sabe é que o sistema como conhecemos está em rearranjo.
O populismo como herdeiro do fascismo: história da herança autoritária

Joyce Miranda Leão Martin. O final da década de 2010 colocou em xeque as democracias tais como as conhecemos: em seus postulados de separação dos poderes, de defesa dos direitos individuais, de proteção às minorias e de direito à oposição. Fenômenos como o Movimento Cinco Estrelas (na Itália), o Brexit (no Reino Unido), e as eleições de Donald Trump (Estados Unidos, 2017-2021), Viktor Orbán (Hungria, 2010-), Tayyip Erdoğan (Turquia, 2014-) e Jair Bolsonaro ( Brasil, 2019-2022) acenderam o alerta de que havia algo errado com os regimes liberais. Palavras como populismo e fascismo voltaram a ser tema de debates públicos, fazendo parte desde páginas de jornais até conferências em congressos e dossiês de periódicos acadêmicos.
Para além do modelo espiral: o impacto de normas e pressões internacionais de direitos humanos

Por Bruno Boti Bernardi e João Roriz. Há mais de setenta anos, os direitos humanos mobilizam afetos, ideias e ações em contextos domésticos e no cenário internacional. Pelo menos desde a década de 1970, os direitos humanos deixaram de ser apenas uma linguagem jurídico-diplomática e impulsionam ciclos de ativismo, denúncia e mobilização social (Moyn, 2010; Kelly, 2018; Sikkink, 2018). Os direitos humanos se consolidaram como uma espécie de língua franca capaz de enquadrar não apenas a vocalização de demandas e reivindicações pela sociedade civil, mas também as próprias políticas públicas de acesso e consecução de bens e garantias. A linguagem e o seu repertório de práticas se impuseram, paulatinamente, tanto sobre outras narrativas rivais de dissenso quanto sobre projetos e visões alternativos de legitimidade política (Donnelly, 2006; Hafner-Burton; Ron, 2009; Beitz, 2009).