Nos dias 18 e 19 de setembro de 2018, às 19 horas, ocorreu, na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP), o seminário “Democracia e desigualdade na América Latina”. O evento foi organizado pelos professores Nilton Ken Ota (Sociologia – USP), Ruy Braga (Sociologia – USP), André Singer (Ciência Política – USP), Bernardo Ricupero (Ciência Política – USP), Jean Tible (Ciência Política – USP) e Patrício Tierno (Ciência Política – USP). Apoiado pela FFLCH-USP, o evento visava, além de debater o tema que lhe dava nome, construir uma rede de pesquisa em torno dele a partir de um referencial teórico específico: a noção de “novo neoliberalismo” formulada pelo professor Christian Laval (Universidade de Paris Nanterre).
No dia 18, o professor Laval abriu o evento com uma conferência intitulada “Anatomia do novo neoliberalismo”, mediada pelo professor Ruy Braga. Além de expor a argumentação presente em A nova razão do mundo (Boitempo, 2016), livro escrito em parceria com Pierre Dardot, Laval buscou formular a tese sobre o “novo neoliberalismo”, cuja marca distintiva seria sua evidente hostilidade à democracia. A eleição de Donald Trump nos Estados Unidos e a ascensão de diversos movimentos abertamente autoritários na Europa Ocidental foram tomados como exemplos. A conferência de Laval foi comentada pelos professores Leonardo Avritzer (Ciência Política – UFMG), Moira Zuazo (Universidade Livre de Berlim – Alemanha), Luciano Concheiro (Universidade Autônoma do México – México) e Sebastian Barros (Universidade Nacional da Patagônia – Argentina). Os comentários visavam colocar o diagnóstico feito por Laval em contato com a realidade latino-americana.
No dia seguinte, ocorreu a mesa-redonda “Os impasses atuais da América Latina”. Mediada pelo professor Avritzer, a mesa foi composta pelos convidados latino-americanos aos quais se somou o professor Singer. A professora Zuazo realizou um panorama da evolução política, econômica e social boliviana no período de ascensão e governo do Movimiento Al Socialismo (MAS), partido do presidente Evo Morales. Frisou, ao final de sua exposição, os recentes questionamentos sofridos pelo MAS, especialmente aqueles organizados pelo movimento “Bolivia dijo No”.
Em contraste com o cenário retratado pela professora Zuazo em sua exposição sobre a Bolívia, o professor Concheiro fez uma efusiva exposição sobre a situação mexicana. Futuro vice-ministro da Educação do governo de Andrés Manuel López Obrador, Concheiro destacou a relação entre Estado e capital no neoliberalismo e o seu resultado “genocida” no México. Utilizando o termo de Achille Mbembe, Concheiro classificou o capitalismo mexicano de “necropolítico”, como revelaria, além das elevadas taxas de mortes, o fato de 40% do PIB do país prover do narcotráfico. Para se contrapor à essa dinâmica perversa, Concheiro expôs algumas das linhas de orientação que deverão ser adotadas pelo Movimiento Regeneración Nacional (Morena) no governo de López Obrador.
O professor Barros analisou o cenário político argentino, com destaque para a crise política e econômica do que chamou de “macrismo”. A adoção de políticas liberalizantes da coalizão “Cambiemos”, base política do presidente Maurício Macri, seria calcada na desregulação da economia e nos ataques à noção de direitos, especialmente dos direitos humanos. De acordo com Barros, Macri reabilitaria a chamada “teoria dos dois demônios”, muito em voga no período ditatorial argentino, para fazer avançar o seu projeto de modernização. Um dos sinais disso seria a repressão estabelecida sobre os povos mapuches, sujeitos que não se enquadrariam aos ditames neoliberalizantes do governo.
Já o professor Singer lançou uma hipótese segundo a qual, no Brasil, estaríamos vivendo uma contradição entre uma necessidade eleitoral, a união das forças democráticas para derrotar o autoritarismo, e uma necessidade política, a de romper com o neoliberalismo. Retomando o exemplo do Syriza (Grécia), Singer destacou que talvez esse seja o principal problema enfrentado pela esquerda contemporânea. Reforçou, ainda, que, à sua maneira, a ex-presidente Dilma Rousseff tentou superar essa contradição e não foi bem-sucedida.
Encerrando a mesa, o professor Christian Laval fez comentários às exposições, os quais giravam em torno dos desafios de reorganização da esquerda diante do “novo neoliberalismo”.
Os vídeos das mesas podem ser acessados nos seguintes links:
https://www.youtube.com/watch?v=1VQojZ_oemo
https://www.youtube.com/watch?v=z8_yeRcIKyI