Ciência com aspas II: político, ideológico, cultural[1]

Por José Szwako. Argumentei na primeira parte deste texto que retóricas, grupos e discursos negacionistas não devem ser rebaixados ao status de primatas pré-lógicos. Ao contrário, a fabricação negacionista de sentidos passa por laços morais e simbólicos que demandam escrutínio mais temperado. Sigamos agora com as últimas implicações da dimensão política, para em seguida ver como aspectos ideológicos e culturais atravessam irremediavelmente a forma pela qual as ciências se tornaram uma arma de peso na artilharia político-discursiva das direitas e das extrema-direitas, embora não somente delas.

Ciência com aspas I: político, ideológico, cultural[1]

Por José Szwako. As ciências entraram no debate político brasileiro sem data para sair. Do Congresso aos movimentos sociais, entre partidos e ativistas, da esquerda à direita, passando por ambos os extremos, chegando às mídias, plataformas e bares, envolvendo e dividindo famílias inteiras no WhatsApp, as ciências são hoje celebradas e hostilizadas, criticadas e relativizadas, hiperdimensionadas e rebaixadas em uma só sentença. Cada um e todos parecem acreditar que dispõem de informação e  conhecimento suficiente para decretar o que é, por exemplo, um Instituto Butantã e por que devemos, ou não, confiar nele assim como em outras instituições e personalidades científicas. No meio disso tudo, de uns tempos para cá, o tal do negacionismo emergiu com força igualmente impressionante no cotidiano, na sociedade civil, na imprensa, no trabalho, nas mídias, na internet, enfim, em nossa vida pública. Vemos grupos de políticos, de artistas, de profissionais liberais (e iliberais também); vemos corporações de médicos e advogados organizados; vemos ainda think tanks, sites e jornais montados por toda sorte de intelectuais e de acadêmicos – munidos com lattes e tudo –; todos bradando palavras de ordem contra autoridades científicas e alegando, de má ou boa-fé, estar em “defesa da ciência” e se dizer contra a “ideologia”.

Oficina de Formação Desjus: Segurança Alimentar, Cinturões Verdes e Resiliência Climática

Por Kenia Antonio Cardoso. Há um vínculo íntimo entre uma cultura alimentar, a cadeia produtiva do alimento e as mudanças climáticas. A compartimentalização do conhecimento gera, em muitos sentidos, uma visão limitada sobre a origem e as consequências dos problemas históricos e políticos vividos na contemporaneidade. Se as revoluções verdes difundiram práticas de esgotamento do solo e mudaram a organização do trabalho no campo, é na agricultura localizada que se encontra importante contribuição para um futuro mais justo. A oficina “Segurança Alimentar, Cinturões Verdes e Resiliência Climática” integra o terceiro ciclo de oficinas, fruto de uma parceria entre o Núcleo Democracia e Ação Coletiva e o Desjus, Núcleo de pesquisa em Desigualdade e Justiça, com o apoio da Fundação Tide Setubal.

A mudança do padrão na politização da burocracia federal brasileira, 1999-2021

Por Antônio Luiz Arquetti Faraco Junior. Desde Max Weber, a politização da burocracia, prática que envolve a nomeação ou designação de pessoas em órgãos governamentais pelo chefe do executivo, tem merecido a atenção de especialistas pelo impacto que pode provocar no desempenho das políticas públicas e na governança (Kennedy     , 2015; Lewis     , 2008). Sua utilização está relacionada à tensão entre controle político e competência técnica na Administração Pública, sendo geralmente aplicada para estabelecer formas de controle e supervisão da burocracia estatal e para o atendimento às demandas de patronagem, contribuindo para construção de apoio político às propostas e ações do governante.

Desconstruindo a Ortodoxia: Violência de gênero no campo político brasileiro

Por Letícia Figueira Moutinho Kulaitis. São inúmeros os exemplos recentes que demonstram como a violência política de gênero impacta profundamente a trajetória de mulheres que ocuparam ou ocupam posições de destaque no cenário político brasileiro. Este fenômeno incide como um obstáculo significativo ao exercício pleno da representação política por mulheres, contribuindo para o enfraquecimento dos sistemas democráticos. 

Relato do evento: “Oficinas de Formação do Desjus: Participação Social por uma Cidade mais Democrática: Desenhos e Desafios”

Por Gabriel Pinho Brochado. No dia 1º de outubro de 2024, o Desjus (CEBRAP), em parceria com a Fundação Tide Setúbal e com o Núcleo de Democracia e Ação Coletiva (NDAC-CEBRAP), realizou o evento “Participação Social por uma Cidade mais Democrática: Desenhos e Desafios”, recebendo os pesquisadores e professores José Szwako (IESP-UERJ) e Carolina Requena (CEM-USP) para discutir o modelo participativo, sua história, desenhos e desafios na cidade de São Paulo. A mediação ficou a cargo do professor Adrian Lavalle (DCP-USP/CEBRAP).

Guerras, G20 Brasil, e a construção de um novo internacionalismo

Por Gilberto Cunha Franca. Nos dias 18 e 19 de novembro, os chefes de Estado que integram o G20 estarão reunidos no Brasil. Ainda que incerta e menos provável, existe a possibilidade de ter na mesma mesa os presidentes dos EUA, Joe Biden, e da Rússia, Vladimir Putin, as duas maiores potências envolvidas direta ou indiretamente nas guerras da Ucrânia e da Faixa de Gaza, que agora se estende para o Líbano e para o Irã. Com o fracasso da ONU e do seu Conselho de Segurança em chegar a um acordo para sequer evitar o escalonamento dessas guerras, é mais provável que não se chegue a qualquer declaração nesse sentido no âmbito do G20. Entre polarizações geopolíticas que se sobrepõem aos acirramentos geoeconômicos, as potências e, diria, indiretamente os demais Estados do G20, parecem mais envolvidos no problema do que na solução.

Novas perspectivas nas eleições municipais: a polarização familialista em Belo Horizonte (MG) e em José da Penha (RN)

Por Helcimara Telles e Bruno Bicalho. As eleições municipais no Brasil vem apresentando mudanças significativas, com um gradual desmantelamento da antiga polarização, na contramão da tendência política em âmbito nacional. Esse ensaio abarca uma análise a partir de uma nova perspectiva sobre a polarização nas eleições municipais em Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, e em José da Penha, uma pequena cidade do interior do Rio Grande do Norte. Diferentemente do cenário presidencial, onde a polarização se intensificou nos últimos anos entre esquerda e direita, a política municipal reflete um sistema proporcional que permite a diversificação de legendas. O Brasil não é bipartidário, pois, existem 29 partidos políticos legalizados no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e isso se torna evidente nas eleições municipais, onde as legendas muitas vezes se articulam em torno de lideranças políticas, focadas em interesses locais mais do que em um programa nacional coeso.

“La historia es nuestra y la hacen los pueblos”: neoliberalismo, memória e sentidos da História após cinco anos do Estallido Social

Por Carlos Eduardo Rezende Landim. “Chile será la tumba del neoliberalismo”; “que nos devuelvan la vida que nos robaron”; “nos deben treinta años”; “no volveremos a la normalidad, porque la normalidad es el problema”. Eis algumas das elocuções mais registradas e entoadas por manifestantes que se rebelaram em outubro de 2019 no Chile, durante a onda de protestos que passou para a história como o estallido social. Iniciados após o aumento do valor da passagem do metrô de Santiago, em um primeiro momento, os protestos tinham demandas específicas de revogação do decreto que prejudicava parte da população mais vulnerável. Entretanto, o curso dos acontecimentos politizou o “mal-estar”, causando grandes fraturas sociais e escancarou caminhos para reversão de um modelo de gestão da vida social sustentado no neoliberalismo (Limón, 2021, p. 10).

O Desafio na Representação Legislativa Carioca

Por Vagner Gomes de Souza. As eleições municipais de 2024 são a primeira de âmbito local na terceira década deste século e a primeira realizada após o anúncio do fim da pandemia da Covid-19. Em 2020, a abstenção eleitoral chegou a números elevados, o que pode ter impactado em muitos resultados eleitorais majoritários, com certeza, isso ocorreu nas eleições legislativas em que o sistema é proporcional. A redução do coeficiente eleitoral por conta do crescimento do não voto (abstenção, brancos e nulos) beneficia ou prejudica as candidaturas mais “ideológicas” ou consolidadas em grandes máquinas eleitorais?